terça-feira, 12 de agosto de 2014

O que nos separa dos animais?


Prepare o seu coração….Pras coisas que eu vou falar….Eu venho lá do sertão…..E posso não te agradar…Então não pude seguir…Valente em lugar tenente…E dono de gado e gente…Porque gado agente marca…Tange, ferra, engorda e mata…Mas com gente é diferente.

Por que com gente é diferente? O que nos separa dos animais? A fala? Eles também têm sua linguagem. A inteligência? Eles realmente não têm capacidade para construir uma bomba atômica. A dor? Os mecanismos fisiológicos são os mesmos. Por quê com eles é diferente?

O que nos aproxima dos animais? Quando alguém é burro como uma anta? Forte como um cavalo? Ladrão como um rato? Idiota como uma toupeira?

Nos diferenciamos dos animais porque nos espelhamos neles para nos afirmar como espécie. Tudo que não gostamos em nós é o que rejeitamos neles, como se tivéssemos vergonha de nosso passado e tivéssemos evoluído e eles não. Eles nos lembram o que queremos esconder. Eles são o nosso espelho e nosso avesso.

Historicamente, a loucura humana antes de ser encarada como uma patologia era identificada quando adotamos comportamentos que não nos são adequados, como ficar nús, comer no chão, gritar descontroladamente, morder os outros e babar. Ainda hoje, quando alguém “perde a razão“ dizemos que ficou louco e parece um animal. Parecer um animal não é adequado, é uma vergonha.

O filósofo franco- argelino Derrida sentiu-se incomodado ao se ver observado por um gato enquanto estava nu. O outro o estava observando e este outro está na verdade muito perto de nós, separado apenas por um olhar. O olhar que não realizamos. O abismo que criamos entre nós e os ”outros” está em não nos reconhecermos mais como animais também, e acharmos que já evoluimos tanto que somos uma categoria superior.

O que nos separa dos animais entretanto, pode ser o que nos deixa sem identidade, uma vez que ao tentarmos negar nossa animalidade, negamos a nós mesmos. A evolução da nossa consciência, capacidade de discernimento e mudanças pensadas não deveria nos separar das outras consciências. Deveríamos ter evoluído para uma espécie onde valores como respeito aos outros e seus níveis evolutivos fosse a regra e não a exceção. Dentre as muitas coisas que nos separam dos outros animais, uma que não nos traz orgulho é o fato de sermos escravagistas para com os outros, porque é o que nos torna menos evoluídos ao contrário do que pensamos. Em algum momento erramos o caminho.
Quando será que veremos com o mesmo horror comermos os outros animais, como vemos com horror a antropofagia hoje? Quando isto acontecer seremos uma espécie melhor, muito melhor…inclusive para nós mesmos.

*Leonardo Maciel Andrade é graduado em medicina veterinária pela UFMG, com aperfeiçoamento em clínica e cirurgia pela UFMG. Mestre em clínica e cirurgia pela UFMG. Especialista em animais silvestres. Ex-parecerista dos comitês de ética da UFMG e PUC-MINAS. Sócio proprietário do Animal Center Hospital Veterinário, que recebe animais silvestres do tráfico e cativeiro clandestino. Co-fundador da Associação Bichos Gerais. Professor de clínica de animais silvestres da PUC-MINAS.

Fonte: Olhar Animal
 



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